O caso recente de uma mulher de 56 anos que morreu em Pernambuco após ser infectada pelo vírus da raiva, ao ser mordida por um sagui, chama atenção para os perigos do contato próximo com animais silvestres. Entre 2010 e 2024, o Ministério da Saúde registrou 48 casos de raiva humana no Brasil, sendo que em dois deles a doença foi transmitida por primatas, como os saguis – um em 2023, outro em 2024. Como a presença de fauna silvestre nas cidades brasileiras é cada vez mais frequente, é essencial seguir alguns cuidados para evitar a transmissão de doenças e não colocar em risco nem a saúde humana, nem a animal.
Segundo a bióloga e diretora do Museu Biológico do Instituto Butantan, Erika Hingst-Zaher, o principal ponto de atenção é não fazer contato direto, já que saguis, capivaras, morcegos, entre outros animais silvestres, podem carregar patógenos, além de serem protegidos por fazerem parte da nossa fauna.
“A proximidade favorece a propagação de diversas doenças. Gambás, por exemplo, são reservatórios da Doença de Chagas, aves podem ser reservatórios da gripe aviária, e saguis e morcegos são reservatórios do vírus da raiva”, diz. Isso significa que, além de transmissões isoladas como o caso da mulher de Pernambuco, esses animais podem ser fonte de potenciais surtos – um exemplo são os recentes casos de gripe aviária registrados nos Estados Unidos.
Doenças que migram de animais para humanos, conhecidas como zoonoses, são responsáveis por cerca de 60% das infecções emergentes, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). A transmissão acontece pelo contato direto com os animais e suas secreções e excretas, como a saliva, as fezes e a urina, ou de forma indireta, por meio de vetores (mosquitos e pulgas), água ou alimentos contaminados. Em caso de acidentes com animais, deve-se procurar atendimento médico imediatamente.
No Butantan, Erika coordena um projeto de pesquisa sobre os impactos dos saguis, primatas originários de outros biomas brasileiros (por isso considerados exóticos à Mata Atlântica) que se estabeleceram e se multiplicaram no parque do Instituto e na área verde da Universidade de São Paulo (USP) há muitos anos. Uma das frentes do trabalho é conscientizar a população sobre a coexistência responsável com esses animais. No caso dos saguis, a chance de haver transmissão de doenças (tanto do humano para o animal, como do animal para o humano) pode ser ainda maior.
Outro cuidado importante é não alimentar animais silvestres como os saguis – nem com frutas, e muito menos com alimentos ultraprocessados. Além de aumentar a população da espécie exótica, que vai se reproduzir mais e ameaçar espécies nativas, este ato prejudica a saúde do próprio animal. Alimentá-los pode alterar seu metabolismo e causar doenças como obesidade, diabetes e colesterol alto, e também interfere em seu comportamento natural, fazendo com que se aproximem demais dos humanos.